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O Mal-Estar do Final do Ano

As festas de fim de ano causam uma sensação de que o cotidiano precisa ser rearrumado.

O Mal-Estar do Final do Ano

Assim como o domingo, que tira o indivíduo de sua rotina semanal, as festas de fim de ano causam uma sensação de que o cotidiano precisa ser rearrumado. Expectativas (sonhos, metas, planejamentos…) que vão se acumulando durante o ano tendem a emergir, no final, de forma intensa, causando mal-estar.

Somos educados a obedecer determinadas normas sociais e, dessa forma, a seguir o calendário. Há pessoas que, diante da proximidade do fim do ano, sentem vontade de celebrar, de encontrar amigos e de presentear. No entanto, cada vez mais indivíduos parecem não se adequar a esse padrão “normal”.

Nesse grupo, há os que assumem que não gostam dessa fase do ano e evitam entrar no “clima”. Para esses, seria melhor ficar recluso até que a poeira das festas assentasse. Existe também outra parcela de pessoas que, de forma inconsciente, apesar de se sentir inclinada a participar das celebrações, se culpa porque não consegue se sentir feliz dentro desse contexto como gostaria.

Para muitos indivíduos, as festas de fim de ano trazem lembranças e memórias do passado. Isso pode gerar a sensação de que o indivíduo falhou, acordando sentimentos de tristeza, angústia e frustração. Mais um ano vai recomeçar e a sensação é de que pode haver mais fracassos do que sucessos a serem contabilizados.

Mas, quando a rotina é alterada no fim do ano, o indivíduo pode se sentir compelido a olhar para a sua realidade sem as distrações do cotidiano. Isso leva a um desafio: o de conseguir sustentar o clima de celebração, felicidade e amorosidade que o senso comum exige como padrão nesse período.

O fim do ano é um momento que convida a uma reflexão sobre a própria vida, de fazer o balanço do ano que se finda e renovar-se para o novo ano. E de reconhecer as próprias expectativas. Mas a maioria dos indivíduos ainda é muito influenciado por discursos prontos, em que o outro aparenta ser mais bem-sucedido em relação à vida, como se experimentasse das melhores coisas do mundo.

Quem nunca se deparou com aquele amigo ou familiar que, nas confraternizações, costuma falar de como é conhecedor de tudo, seja do mais trivial - como seguir uma organização rotineira eficaz - ou do que há de mais requintado, como entender de vinhos. Assim, quem também almeja isso, pode se sentir culpado e se julgar leniente frente a não concretização dos próprios desejos.

Nesse sentido, estamos exatamente onde é apropriado estar. E isso não significa, de forma alguma, acomodação. Mas ter a sabedoria de não entrar no clima geral, que desbanca em criticar o modo de vida do outro ou em querer conquistar o que o outro conquistou. É sempre importante refletir sobre os próprios desejos de felicidade. Vidas perfeitas só existem em peças publicitárias.

Esperar do mundo o que ele não pode dar é a causa de muito sofrimento psíquico. Não dá para tomar para si as expectativas do outro. Não há nada de certo ou de errado em gostar ou não das festas de final de ano. Mas, também, não há como negar que elas fazem parte do calendário.

Como disse Machado de Assis: “É melhor, muito melhor, contentar-se com a realidade; se ela não é tão brilhante como os sonhos, tem pelo menos a vantagem de existir”.

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